Se tem alguém capaz de analisar essa luta das mulheres no automobilismo, ela se chama Mariana Becker.
Afinal de contas, a gaúcha acompanha o mundo das corridas, de perto, desde 2008, na Globo e, a partir de 2021, no Grupo Bandeirantes. Entre uma viagem e outra, ela arrumou um tempinho para falar com o site.
Confira a entrevista na íntegra.
Nas Pistas: Segundo dados do GP Brasil, a presença de mulheres, na prova, saltou de 20,7% para 35,4% em 2022. A que fator você atribui esse aumento, visto que a F1 tem etapas em lugares como Arábia Saudita?
Mariana Becker: O interesse feminino se deve a uma série de fatores: popularização do esporte graças à série Drive to Survive, a abertura das mídias sociais, a presença dos e-sports, e também a representatividade de mulheres reportando à F1. Enquanto a mulher, a menina, não se vê representada dentro de um carro de corrida, ela se vê através das repórteres, das comentaristas. O mundo não é mais exclusivamente masculino e ela se sente mais acolhida.
NP: Muitos jovens passaram a se interessar pela categoria com o “Drive To Survive”. Você também percebe esse movimento em suas redes sociais, por exemplo?
Mariana: Sinto bastante esse movimento, tenho seguidores de todas as idades. No início, era uma galera dos 40+ e agora tem uma garotada da idade dos pilotos de 22, 23 anos, inclusive crianças. Mesmo na noite de autógrafos do meu livro (Não Inventa, Mariana! Ed. Labrador), que não é essencialmente de F1, vi uma dupla super comum na fila: a filha de 15 e o pai de 50 anos. A F1 tem um novo perfil de público e um novo perfil de cobertura também. É importante informar quem entende e acolher quem tá chegando, explicar.
NP: Crê que projetos como o Girls On Track da FIA são para valer?
Mariana: A Fórmula W acabou antes do fim do campeonato. Agora, existe a F1 Academy com um campeonato garantido e ainda o Girls On Track. Acho importantíssimo que haja estas iniciativas. Comecei a cobrir F1 numa época em que ririam de propostas como estas. No entanto, ainda estamos longe do objetivo final que é ter mais mulheres em todas as categorias do automobilismo e alcançar a F1, estes são projetos de médio/longo prazo que precisam de resiliência. Olhe pra trás e veja quantas décadas homens correm de carro, olhe pra trás e veja há quantas décadas que mulheres dirigem nas ruas. Estou falando de quantidade e não de casos isolados, a minha mãe faz parte dessa primeira geração. Até hoje se ouve: tinha que ser mulher. Portanto é preciso insistência e investimento. Talento e capacidade, obviamente existem, mas não se pode viver de exceções.
NP: Acredita que você entrevistará mulheres pilotos de F1, ainda?
Mariana: Não sei, mas com certeza seria muito legal. Eu entrevistei a primeira delas, a (ex-piloto) Maria Theresa de Filipis, correu com Fangio. Também entrevistei Suzie Wolff, que chegou a fazer treinos livres pela Williams, e a Maria de Villota, morreu depois de um grave acidente em um dia de treinos. Ainda ouvi no padoque “ também né…” Eu gostaria muito que tivessem mulher e mesmo que eu não esteja mais cobrindo a F1, passo no padock só pra entrevistar (risos).
NP: No dia a dia das corridas temos você e a Julianne Cerasoli (produtora) na equipe da Band. Já se sentem respeitadas perante a jornalistas homens no paddock?
Mariana: Sim, sentimos. Claro que demorou, vieram muitos “testes” pra saber se eu sabia mesmo do que eu estava falando, diminuição de valor da informação, desconfiança, mas isso foi passando e hoje não há diferença. Às vezes tem que ter paciência mas não é algo que me afeta mais.